Edvaldo Sant´Ana Lourenço[2]
Ludmila Ferreira Tristão
Garcia[3]
Rafaela Emily Tadeu de Araújo[4]
Resumo
O presente artigo tem como principal
objetivo apresentar importantes esclarecimentos sobre a metodologia que visa
tratar e analisar informações em pesquisas científicas, intitulado por análise
de conteúdo. Inicialmente o estudo expõe reflexões acerca do contexto histórico
constitutivo da metodologia, em consonância a esse, também apresenta o que de
fato se concretiza como análise de conteúdo. Em seguida, o estudo contribui
para o conhecimento do método descritivo analítico que é utilizado para a
análise das mensagens, apontando assim, a importância das categorias,
inferências e interpretação dos dados obtidos na análise. Além disso, discute a
atuação das técnicas dessa metodologia relacionadas à área
tecnológica/informática, e por fim propõe questionamentos sobre a limitação de
tal método, além de suas contribuições para pesquisa em educação.
Palavras-chave: Metodologia
científica; Análise de conteúdo; Comunicação; Educação.
Abstract
This article
aims to present important clarifications on the methodology that aims to treat
and analyze information on scientific research, entitled by content analysis.
Initially, the study presents reflections on the constitutive historical
context of the methodology, in line with this, also features what actually
materializes as content analysis. Then, the study contributes to the knowledge
of the analytical descriptive method that is used for the analysis of the
messages, pointing thus the importance of the categories, inferences and
interpretation of data obtained in the analysis. Further, it discusses the
performance of the techniques of this methodology related to the technological
area / computer, and finally proposes questions about the limitations of such a
method, as well as his contributions to educational research.
Key words: Scientific Methodology; Content
Analysis; Communication; Education.
Contextualizando
a Análise de Conteúdo
Entre as diversas
técnicas utilizadas no ambiente acadêmico para a concretização de um projeto de
pesquisa pode-se citar: na área da ciência - pesquisa teórica, pesquisa
metodológica, pesquisa empírica, pesquisa prática; na natureza - trabalho
científico original, resumo de assunto; nos objetivos - pesquisa exploratória,
pesquisa descritiva, pesquisa explicativa; nos procedimentos: pesquisa de
campo, pesquisa de fonte de papel; no objeto: pesquisa bibliográfica, pesquisa de
laboratório, pesquisa de campo; na forma de abordagem: pesquisa quantitativa,
pesquisa qualitativa, bem como na análise de discurso e na análise de conteúdo,
podendo a mesma ser aplicada tanto a pesquisas de caráter qualitativo quanto
quantitativo cada um com as suas especificidades. (MINAYO, 2007).
Triviños (1928) traz
relatos de eventos que mostram a pesquisa segundo a análise de conteúdo sendo
utilizada ao longo da história em diferentes países e contextos. Sendo seu
nascimento nas primeiras tentativas de interpretação dos manuscritos sagrados,
por meio da hermenêutica, mas que a sistematização da mesma ocorreu por volta
dos séculos XVII na Suécia, XIX na França e em 1908 com Thomas, professor em
Chicago, ao elaborar um quadro de valores e atitudes dos imigrantes polacos por
meio de análise de materiais como jornais, cartas e autobiografias.
Outro importante marco
histórico relatado por Triviños (1928) dá-se na década de 20 por ocasião da
Primeira Grande Guerra Mundial, onde Leavell organiza estudos quanto as
propagandas realizadas na época para divulgação de materiais de guerra. Ainda
relacionando a propaganda, porém na Segunda Guerra Mundial, as disciplinas nas
áreas do conhecimento como Linguística, Literatura Autobiográfica, a
Psicanálise e Psicologia Clínica, fazem uso da análise de conteúdo para estudar
e sistematizar a propaganda neste evento bélico.
Em 1948 o autor
prossegue a descrever a importância de Berelson e Lazarfeldt quando os mesmos
escrevem como se fosse um manual as regras para que de fato a análise de
conteúdo se efetivasse. Berelson (1954) apud Bardin (2011, p. 18) traz uma
importante definição para a análise de conteúdo, sendo ela “uma técnica de
investigação que tem por finalidade a descrição objetiva, sistemática e
quantitativa do conteúdo manifesto da comunicação”.
Várias conferências
seguiram e marcaram discussões importantes de pesquisadores com o intuito de
definir regras, princípios, métodos quanto à análise de conteúdo, por exemplo,
na Conferência de Alberton em 1955 em Illinois.
Todo esse contexto histórico concretiza-se
como forte estrutura para a construção conceitual da análise de conteúdo, que
sem dúvidas permitirá afirmar que a mesma configura-se como um conjunto de
técnicas de interpretação que se baseia na formulação de categorias,
tornando-se estas o arcabouço para a investigação de idéias, mensagens nas
comunicações de massas.
A comunicação é
elemento essencial para que o homem possa estabelecer relação social. O homem é
um ser social. Nesse sentido, para estabelecer uma relação se faz necessário a
presença do emissor e do receptor que fazendo uso de signos, sinais devidamente
organizados. Toda comunicação é realizada por meio de uma mensagem que precisa
ser contextualizada e transmitida com acuidade sem erros e ruídos.
O emissor é aquele que
emite uma mensagem, o receptor é quem recebe a mensagem. A mensagem por sua vez
é o conjunto de informações que são transmitidas pelo canal de comunicação que
pode se dar pelo meio concreto pelo qual a mensagem é transmitida, seja voz,
livro, revista, emissora de TV, jornal e computador.
O conteúdo dessa
mensagem estabelecida entre emissor e receptor é objeto da análise de conteúdo
aqui problematizada. Inicialmente essa investigação com suporte nessa técnica
se constituirá de forma objetiva,
sistemática e quantitativa, contudo, com a evolução das discussões sobre este
método na década de 50 ela também passa a adquirir um caráter qualitativo. E
nessa perspectiva a análise de conteúdo permite a realização de inferências por
meio de teorias previamente conhecidas na condução da aplicação do método.
Quando se fala de
análise de conteúdo, sem dúvida, o marco em termos de definição de critérios e
etapas para a aplicação desta técnica de pesquisa é a autora Laurence Bardin,
professora-assistente de Psicologia na Universidade de Paris V, cuja publicação
mais notável é “L'analyse de contenu” de 1977. Bardin
apresenta como berço da análise de conteúdo os Estados Unidos há mais de meio
século atuando de forma instrumental na análise das comunicações.
Em sua obra Bardin
(2011) sistematiza as fases da análise de conteúdo sendo elas divididas em três
polos que são seguidos por ordem cronológica, ou seja, passos norteadores para
a concretização desta técnica de pesquisa, sendo eles: primeiramente a
pré-análise; em segundo lugar a exploração do material; em terceiro o
tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação.
A seguir será detalhado
cada um destes pólos com o intuito de melhor entendimento e apropriação da
análise de conteúdo.
Descrição
Analítica do Método de Análise de Conteúdo
A
Pré-análise
Segundo Bardin (2011,
p.15), a análise do conteúdo é um conjunto de instrumentos de cunho
metodológico em constante aperfeiçoamento, que se aplicam a discursos
(conteúdos) extremamente diversificados. Como estratégia metodológica, a autora
apresenta a pré-analise.
Bardin (2011) explica
que na pré-análise é onde ocorrerá toda a organização de ideias iniciais que
sucederão o plano ou projeto de análise do material pesquisado, na qual alguns
objetivos e metas devem ser traçados como: “a escolha dos documentos a serem
analisados; a formulação das hipóteses e dos objetivos; e a elaboração de
indicadores que fundamentam a interpretação final”.
Para a autora em
questão, inicialmente se faz necessário a realização de uma “leitura
flutuante”, nome utilizado para designar a tarefa de ter um primeiro contato
com os documentos a serem analisados. Conceitualmente Bardin (2011) diz que a
leitura flutuante “É uma leitura que
pouco a pouco vai se tornando mais precisa, em função das hipóteses que vão
surgindo, em função das projeções teorias que podem ser adotadas ao material,
ou da possível aplicação de técnicas.” (Bardin, p.126).
Ainda na composição da
pré-análise têm-se a constituição do corpus da pesquisa, sendo este “[...] o
conjunto dos documentos tidos em conta para serem submetidos aos procedimentos
analíticos. A sua constituição implica, muitas vezes, escolhas, seleções e
regras” (Bardin, p.126). Com o intuito de compor o corpus da pesquisa o
pesquisador na escolha dos documentos deverá recorrer ao que Bardin nomeia de
regras da composição do corpus, assim a autora define quatro regras, são elas:
regra da exaustividade, regra da representatividade, regra da homogeneidade e
regra da pertinência
A regra da
exaustividade consiste em analisar o máximo de materiais existentes para
análise de determinada temática/assunto escolhido, além disso, não se deve
omitir nada, esta regra também é complementada pela não seletividade.
Em seguida na regra de
representatividade seleciona-se uma amostra do material que melhor represente a
sua totalidade.
Enquanto que, a regra
da homogeneidade os documentos escolhidos precisam seguir a mesma ordem de
critérios, para que os dados coletados não passem por seleções distintas, ou
seja, os dados devem referir-se ao mesmo tema, serem obtidos por técnicas
iguais e colhidos por indivíduos semelhantes.
E por fim a regra de
pertinência que indica que os documentos selecionados devem ir de encontro com
o objetivo e conteúdo da pesquisa em análise.
Após explorar como deve
se dar a escolha dos documentos Bardin (2011) explica como proceder na
formulação das hipóteses e dos objetivos. Para tanto ela inicia com as
definições de hipótese e objetivo, assim elucidadas:
Uma hipótese é uma afirmação
provisória que nos propomos a verificar (confirmar ou informar), recorrendo aos
procedimentos de análise. Trata-se de uma suposição cuja origem é a intuição e
que permanece em suspenso enquanto não for submetida à prova de dados seguros.
O objetivo é a finalidade geral a que nos propomos (ou que é fornecida por uma
instância exterior), o quadro teórico e/ou pragmático, no qual os resultados
obtidos serão utilizados. (BARDIN, p. 128, 2011).
Elaboradas
as hipóteses e os objetivos passa-se a referenciação dos índices e a elaboração
de indicadores que terão a função de facilitar a operação de comparação entre
as unidades escolhidas como recorte do texto para compreensão do assunto em
análise.
Posteriormente
a elaboração dos indicadores, a etapa da pré-análise passará a ser composta
pela a preparação do material, por exemplo, após uma entrevista o pesquisador
deverá digitá-la para análise, de forma que impressa em quantas cópias forem
necessárias, possua espaço na folha para colocar as devidas anotações, atribuir
códigos, observações, ou se escolher os meios e recursos tecnológicos, como o
computador, selecionar as funções conforme programa para facilitar a análise e
interpretação do material em estudo.
Cumprida estas tarefas
parte-se para a próxima fase da análise de conteúdo denominada exploração do
material conforme será abordada a seguir.
Exploração
do material
Para
exploração do material Bardin (2011) conta com algumas operações essenciais
para a sua efetivação, sendo estas: a codificação e a decomposição ou
enumeração. Para Holsti apud Bardin (2011, p. 133) a codificação refere-se a:
(...) processo pelo qual os dados brutos são transformados sistematicamente e
agregados em unidades, as quais permitem uma descrição exata das
características pertinentes do conteúdo.
Desta
forma, na codificação faz-se um recorte dos dados brutos em pequenas unidades
que expressam as ideias essenciais do assunto abordado, além da enumeração
destas unidades, e a classificação e agregação por meio da escolha de categorias
para as unidades em análise.
CAVALCANTE, CALIXTO,
PINHEIRO (2007 apud, Minayo, 2014) corrobora a idéia de Bardin, e também afirma
que nesta fase o investigador busca encontrar categorias, redução do texto às
palavras e expressões significativas em função das quais o conteúdo de uma fala
será organizado. Em síntese, esta é uma fase essencialmente constituída em
operações de codificação-recorte do texto em unidades de registro (palavras,
frases, temas, personagens, acontecimentos) sendo estes relevantes para a
pré-análise.
O
tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação
Nessa fase para Minayo
(2007 apud, CAVALCANTE, CALIXTO, PINHEIRO, 2014) o pesquisador classifica e
agrega os dados, escolhendo as categorias teóricas ou empíricas responsáveis
pela especificação do tema. A partir daí, o analista propõe inferências e
realiza interpretações, inter-relacionando-as com o quadro teórico desenhado
inicialmente ou abre outras pistas em torno de novas dimensões teóricas e
interpretativas, sugerida pela leitura do material.
Ainda,
para que o tratamento dos resultados seja de fato válido e significativo
utiliza-se as provas oferecidas pela estatística, seja ela simples como nas
percentagens, ou mesmo as complexas baseadas, por exemplo, na análise fatorial.
Os quadros, diagramas, figuras e modelos são alguns exemplos possíveis para
representação dos dados escolhidos para interpretação e formulação de
inferências quanto ao assunto a ser tratado.
A Informatização das
Análises das Comunicações
Para Bardin, a
informatização das análises pode apresentar uma resposta parcial e até ambígua,
por isso, configura-se como um possível auxílio dentro das particularidades de
uma técnica específica. Bardin (2011, p.175) destaca o uso do computador nos
seguintes casos:
• A
unidade da análise é a palavra, o indicador é frequencial (número de vezes em
que a palavra ocorre);
• A
análise complexa e comporta um grande número de variáveis a tratar em
simultâneo (por exemplo: número elevado de categorias e unidades a registrar);
• Deseja-se
efetuar uma análise de concorrências (aparição de duas ou várias unidades de
registro na mesma unidade de contingência);
• A
investigação implica várias análises sucessivas; o computador permite preparar
os dados e armazená-los para usos sucessivos;
• A
análise necessita, no fim da investigação, de operações estatísticas e
numéricas complexas.
Já nos casos
a seguir o uso do computador pode ser inútil (Bardin, 2011. p.175):
• A
análise é exploratória e a técnica não é ainda definitiva;
• A
análise é única e debruça-se sobre documentos especializados;
• A
unidade de codificação é grande (exemplo: discurso ou artigo) espacial ou
temporal.
Análise
de Conteúdo x Análise de discurso
Outra ferramenta importante é a análise de discurso, essa é uma metodologia
científica de pesquisa legítima que tem como objetivo analisar e levar a
reflexão a cerca das construções das relações de poder, ideologias e pode ser
utilizada para explorar a proposta de pesquisa. A análise de conteúdo traz uma
abordagem a cerca das informações, enquanto coleta de dados e substratos
importantes presentes na mensagem que foi transmitida pelo emissor, enquanto a
análise de discurso aprofunda a temática a partir de suas ideologias e
mensagens ditas no não dito. Ambas são ferramentas importantes para que possam
auxiliar o pesquisador na execução de suas metas e alcançar seu objetivo na
pesquisa científica.
Limitações
da Análise de Conteúdo
O conjunto de técnicas de análise de conteúdo apresenta algumas
limitações, uma delas trata-se da incoerência entre o distanciamento do
pesquisador em relação à pesquisa, principalmente pelo fato da necessidade que
se tenha de uma leitura aprofundada e de proximidade em uma pesquisa
qualitativa.
Outra importante limite a ser considerado é vivenciado no trabalho com a
subjetividade, pois ao trabalhar com a subjetividade do sujeito a pesquisa
qualitativa pode permitir em alguns momentos que a análise do observador esteja
impregnada de seus pré-conceitos, o que acaba por refletir no objeto estudado.
E ainda é necessário pontuar que o
pesquisador seja capaz de extrapolar a sua análise no que está para além do
texto, para isso é preciso ter domínio das técnicas propostas na análise de
conteúdo.
Considerações
Finais
Tendo em vista, que o
objeto de investigação da educação é o homem que educa e que é educado, ele se
faz muito complexo e diverso. Assim o método da análise de conteúdo vem ao
encontro de uma proposta que busca desmontar uma determinada mensagem proferida
por um determinado homem multifacetado. Desse modo, em função desse homem
múltiplo é possível verificar variadas e contraditórias características no
mesmo, e nesse sentido, essa técnica visa compreender criticamente o sentido
manifesto e oculto das comunicações imerso a esse contexto interrogativo.
Então este conjunto de técnicas tem como principal objetivo auxiliar a
educação, especificamente quanto ao seu “problema” pedagógico no processo de
entendimento e de construção de seu objeto de investigação- homem. Assim, com
um olhar holístico enxergar o que está para além ou aquém de uma determinada
mensagem, estudando fenômenos sociais atrelado ao um objeto, e conseqüentemente
as suas interações.
REFERÊNCIAS
BARDIN,
Lawrence. Análise de Conteúdo. Trad.
Luís A. Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70, 2011.
CAVALCANTE,
Ricardo Bezerra.;CALIXTO, Pedro.;PINHEIRO, Marta Macedo Kerr, Análise de Conteúdo: considerações
gerais, relações com a pergunta de pesquisa, possibilidades e limitações do
método. Rev. Inf. & Soc.:Est., João
Pessoa, v.24, n.1, p. 13-18, jan./abr. 2014
MINAYO,
Maria Cecília de Souza. O Desafio do Conhecimento: Pesquisa Qualitativa em Saúde. 10. ed. São
Paulo: HUCITEC, 2007. 406 p.
SEVERINO,
Antônio J. Metodologia do trabalho
científico. 23ed São Paulo:
Cortez: Autores Associados, 2007.
TRIVIÑOS, Augusto N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa
em ciências sociais. São Paulo: Atlas, 1997.
[1] Artigo
apresentado na disciplina Fundamentos de Pesquisa - Programa de Pós- Graduação
de Educação
da Universidade Federal de Uberlândia- MG.
[2] Mestrando em Educação pela Universidade Federal de
Uberlândia. Graduado em Filosofia pela Faculdade Católica de Uberlândia.
Educador social e gestor de projetos sociais. Tem experiência nas áreas de
educação e gestão social, atuando principalmente nos seguintes temas:
biopolitica, emancipação social, inclusão, empreendedorismo social, terceiro
setor e responsabilidade socioambiental/ email: edvaldosalo@gmail.com
[3] Mestranda em
Educação no Programa de Pós- Graduação de Educação da Universidade Federal de
Uberlândia- MG- Linha: Estado, Políticas e Gestão da Educação/ email:
ludmilaftgarcia@hotmail.com
[4] Mestranda em
Educação no Programa de Pós- Graduação de Educação da Universidade Federal de
Uberlândia- MG- Linha: Estado, Políticas e Gestão da Educação/ email:
rafaelaemily@hotmail.com